domingo, 28 de outubro de 2018

Análise verbal e não-verbal: Haddad e a bíblia. Furto ou jogada no lixo?

Durante um ato político em Fortaleza, o candidato à Presidência Fernando Haddad, recebeu de um admirador e estudante da Unilab, uma bíblia, como forma de agradecê-lo por ter criado a universidade da Redenção.
Um dia depois, um deputado do PSL veio à público dizer que a bíblia dada de presente foi achada no chão, próximo aonde aconteceu o ato político..
O candidato Fernando Haddad fez um vídeo dizendo que a bíblia tinha sido furtada e por isso estava no lixo. Será que ele está sendo honesto?

"Este presente artigo não tem como objetivo manter ou defender uma posição política. A análise é feita, exclusivamente, com base em ciências comportamentais e tem a única finalidade de instruir."

Vamos à análise:

O candidato Haddad começa o vídeo dizendo: "Eu estava em Fortaleza, se eu não me engano, onde eu recebi... um presente. Esse presente era uma bíblia... de um... de um aluno da UNILAB...".
O uso dessa expressão "se eu não me engano" geralmente indica uma incerteza genuína, mas nesse contexto, a incerteza é deliberada e também indica evasividade, desejo de fugir da situação; isso porque foi em Fortaleza o fato gerador de algo que causou uma repercussão negativa, por isso o desejo inconsciente de fugir. Certamente Haddad sabe que estava em Fortaleza.
Não-verbalmente, ele contrai o corrugador abaixando as sobrancelhas, tensiona as pálpebras superiores e gira a cabeça para a direita (foto acima). Esse conjunto gestual mostra um esquecimento falso com uma intensão de ser evasivo, como vazamento.
Nesse mesmo trecho, podemos notar várias pausas desnecessárias quebrando a fluidez do discurso. Isso nos indica que o discurso de Haddad é completamente armado e ensaiado e mostrando muita cautela para que não fale algo fora do script.
O candidato Haddad usa um tom de voz sem alteração complementando a conclusão acima.

A partir de 0:15, o candidato diz: "Nós im-imaginávamos que... essa bíblia tivesse sido... extraviada, assim... alguém que tava no palco pegou a bíblia... porque a bíblia desapareceu... do palco... no momento em que a Ana Estela, minha esposa, estava... discursando. Nesse momento que ela tava discursando... a bíblia sumiu."
O trecho começa com uma gagueira do candidato ao dizer "imaginávamos", indicando ansiedade. Juntamente podemos ver a elevação bilateral dos ombros (foto acima), indicando, segundo Joe Navarro, falta de confiança e incerteza.
Em um primeiro momento, o candidato diz que a bíblia foi extraviada; em seguida afirma que alguém que estava no palco a pegou; Mais a frente, Haddad diz que a bíblia desapareceu e no final do trecho ele diz que a bíblia sumiu.
Haddad usa quatro verbos para explicar o que aconteceu com a bíblia. Levando em consideração que a intenção do candidato é dizer que ela foi roubada (ou furtada) por alguém, essas escolhas diferentes de palavras para explicar um mesmo fato nos indicam incerteza em relação ao crime de roubo ou furto.
Em um determinado momento do trecho, Fernando Haddad diz que alguém que estava no palco pegou a bíblia. A doutrina de Statement Analysis conclui que essa frase tem assertividade fraca pois não é possível concluir que alguém a pegou somente pelo fato dela ter desaparecido.
Novamente, o candidato Haddad usa pausas desnecessárias para ganhar tempo e lembrar do que se prontificou a falar. Discurso armado.
Há também repetição de elementos, como podemos ver quando o candidato fala: "... Ana Estela, minha esposa, estava DISCURSANDO. Nesse momento em que ela estava DISCURSANDO". A repetição de elementos é desnecessária em um discurso tornando-o mais artificial. É um forte indicativo de desejo de cautela; evitando sair do script. Um discurso correto e verdadeiro seria: "Ana Estela, minha esposa, estava discursando e nesse momento...".

A partir de 0:37, o candidato diz: "... e foi para na mão de um pastor... me acusando de ter jogado a bíblia no lixo..."
Novamente há pausas desnecessárias representando uma intenção de falar o que foi combinado, de não errar o script.
No final desse trecho, além do longo tempo de pausa entre a verbalizalização de "lixo" e a palavra subsequente, Haddad realiza o chamado "Deliberate Gaze" esse tipo de olhar, amplamente estudado por Aldert Vrij consiste em um olhar mais prolongado direcionado à pessoa com quem se fala; sua intenção é de buscar aprovação e se certificar de que a pessoa acreditou no que acabou de dizer.
Enquanto verbaliza a palavra "lixo", Fernando Haddad exibe uma expressão de desprezo combinada com satisfação, conhecida como "Duping Delight" (foto acima). Esse tipo de expressão é emitida, segundo Paul Ekman quando o agente percebe que sua mentira foi creditada pelos interlocutores e obteve sucesso em sua manipulação.

A partir de 0:52, Fernando Haddad atribui a autoria da acusação de ter jogado à bíblia no lixo, a um deputado do PSL, e complementa que o mesmo é do partido político do Bolsonaro. Ao falar isso, o candidato Fernando Haddad cria uma associação emocional entre Bolsonaro, seu partido, e a acusação, no intuito de relacionar a ação negativa ao fato de ter ligação com Bolsonaro.

Em 1:04, Fernando Haddad é congruente ao falar que a bíblia encontrada no lixo é a mesma que lhe foi dada de presente.
Haddad afirma com a cabeça ao mesmo tempo que afirma verbalmente.
Há honestidade.

A partir de 1:09, Haddad diz: "Ela foi furt... nós imaginamos que alguém tinha... tinha pegado a bíblia".
Inicialmente, o candidato mostra um desejo de expressar que a bíblia foi furtada, mas no meio do processo cognitivo, ele modifica o discurso para "tinha pegado".
Esse trecho mostra uma incerteza de que a bíblia foi realmente furtada.
Podemos notar também que nesse trecho, já no final, seu corpo se movimenta de forma descoordenada, demonstrando ansiedade, tensão e nervosismo.

Em 1:19 ao afirmar que achava que alguém que estava no palco tinha pego a bíblica, Haddad demonstra um conjunto não-verbal que demonstra incerteza: elevação dos ombros, movimentos rápidos de negação com a cabeça e uma configuração de U invertido com os lábios.

A partir de 1:20, Haddad diz: "Ligamos para várias pessoas para saber o paradeiro dela, e não encontramos o paradeiro dela..."
Fernando Haddad usa um recurso de repetição ao falar "paradeiro dela". Sua intenção é gerar convencimento e, de uma forma secundária, deseja verbalizar exatamente aquilo que foi treinado, ensaiado a falar.

A partir de 1:27, diz: "Hoje, surge um vídeo dessa bíblia... na mão... de um... Deputado do Bolsonaro, dizendo que a encontrou no lixo... quando na verdade al... hoje nos sabemos que ela foi furtada em virtude do vídeo..."
Novamente há o uso de pausas desnecessárias indicando um discurso armado e uma cautela em sua verbalização
Haddad repete o mesmo argumento que já tinha usado em momentos antes. A diferença é que ele usa outras palavras para descrever. Ele troca a palavra "tinha pegado" por "furtada".
Esses elementos indicam que além de um discurso ensaiado há desonestidade e incerteza.


A partir de 1:51, diz: "E nesse mesmo dia, foi furtado um celular... no mesmo palco... foi furtado um celular do Zé Chrispiniano... que é, todo mundo sabe, assessor de imprensa do Instituto Lula. O celular não apareceu; a bíblia não apareceu. Ele teve que comprar um celular, inclusive, lá no Ceará. Tem nota fiscal e tudo do celular que ele teve que comprar...ééé... saindo de Fortaleza, se eu não me engano em Juazeiro do Norte, ele comprou o celular, porque foi roubado..."
Estamos diante de um recurso verbal chamado de "Deflexão". Segundo o especialista internacional Dr. David Craig, trata-se de uma maneira do agente desviar a atenção de algum assunto com o intuito de evitar ser questionado sobre tal.
Junto com esse recurso, Fernando Haddad usa uma linguagem associativa. Ele associa um fato desonesto (perda da bíblia) a um fato que aconteceu realmente (a compra de um celular novo). Associar um fato mentiroso a um verdadeiro gera uma maior credibilidade ao fato desonesto.
Há também um excesso de detalhes aonde diz exatamente aonde o celular foi comprado. Excesso de detalhes, segundo estudos de Statement Analysis, é um grande indicativo de desonestidade, com uma intenção de convencer através dos detalhes narrados.
Ao dizer: "O celular não apareceu", ele realiza um movimento descoordenado com a cabeça com sinais de afirmação seguido por um de negação. Podemos afirmar que essa frase gera ansiedade e nervosismo ao candidato, e confirma a desonestidade.
Ao verbalizar "a bíblia não apareceu" ele afirma com a cabeça; havendo portanto, incongruência entre o verbal e o não-verbal. Ele sabe que a bíblia reapareceu.
Quando diz que tem nota fiscal, Haddad tem seus movimentos corporais descoordenados, indicando intenso nervosismo nessa afirmação.
No final Haddad modifica o verbo. No começo do trecho, ele diz que o celular foi furtado e no final ele diz que o celular foi roubado. Essa mudança demonstra incerteza.

Em 3:06, Haddad realiza um gesto com os lábios chamado de "Lip Purse". Esse movimento consiste em projetar a frente os lábios, e indica um desejo de omitir um planejamento/intenção. Em outras palavras, Fernando Haddad planejou um discurso, uma ideia, uma intenção, e está colocando em prática e acredita que terá sucesso com o resultado.
Junto, Haddad emite o chamado "Duping Delight", que segundo Ekman, é um sorriso de desprezo e satisfação de ver que a manipulação realizada obteve sucesso diante dos interlocutores.
O discurso termina com uma pergunta, confirmando sua incerteza.


SUMÁRIO: Fernando Haddad demonstra um discurso completamente ensaiado e racional. Em vários momentos ele se perde, e usa da repetição para convencer. O discurso não segue uma lógica e nem uma cronologia, em vários momentos
Há desonestidade quanto a bíblia ter sido furtada. Haddad não acredita nisso; O furto do celular também não aconteceu
Houve a intenção de criar uma associação entre o ato criminoso e esse ato ter sido praticado por um político ligado a Jair Bolsonaro.

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