sábado, 27 de abril de 2019

Análise não-verbal: Entrevista de Lula na prisão. Dominância

Recentemente o ex-Presidente Lula concedeu a primeira entrevista na cadeia desde que foi preso. Com autorização judicial, a entrevista foi realizada pelos jornais Folha de São Paulo e El País. Ela aconteceu em uma sala preparada pela Polícia Federal na própria sede do Órgão, em Curitiba; e foi autorizada, mediante revisão, pelo Presidente do STF, Dias Toffoli.
Após mais de um ano preso, o que será que sua Linguagem Corporal tem a nos dizer?

Vamos à análise:

Podemos observar em 0:12 que Lula chega para a entrevista emitindo uma emoção de felicidade devido a contração dos músculos do zigomático maior e os orbiculares dos olhos.

A partir de 0:42, a repórter do jornal Folha de São Paulo dirige uma pergunta a Lula: "A gente queria saber o que passou pela cabeça do senhor quando o senhor tava... sendo preso, sendo conduzido... para a prisão?"
Lula começa respondendo: "eu tomei como decisão que meu lugar é aqui". Nesse momento ele se inclina para a frente porém nega com a cabeça. Gesto incongruente. Enquanto o verbal afirma, o não-verbal nega

A partir de 0:54, Lula continua: "Eu tenho tanta obsessão de desmascarar o Moro. Desmascarar o Dallagnol e sua turma. E desmascarar aqueles que me condenaram... sabe?..."
Lula começa esse trecho fazendo um gesto mãos fechadas em forma de socos. Esse gesto é considerado alfa (maior dominância, assertividade e até agressividade); ele nos indica intenção de resistência, luta.

Ainda referente ao trecho acima, quando Lula fala da sua obsessão em desmascarar o atual Ministro da Justiça e o Procurador Daltan Dallagnol, podemos notar um sutil desalinhamento corporal. O tronco de Lula aponta para uma direção diferente da cabeça.
Por ser um comportamento corporal atípico, podemos dizer que existe algum fator de desonestidade nessa fala.

Em 1:03 - 1:04, Lula diz: "... que eu ficarei preso cem anos"
Nesse momento podemos notar um avanço corporal juntamente com uma negação de cabeça. Há, portanto, incongruência. Enquanto o ex-Presidente afirma com as palavras, ele nega com a cabeça

Em 1:14, Lula diz: "Por isso, eu vim pra cá com muita tranquilidade"
Aqui podemos notar três sinais interessantes. Lula gesticula com as palmas das mãos para baixo. Esse gesto ilustrador (ilustram a fala) é considerado alfa, pois indica dominância, autoridade, e em alguns casos, até agressividade. Juntamente com o gesto, Lula nega com a cabeça, mostrando uma incongruência entre o que fala (afirmação) e com o que expressa não-verbalmente (negação). Além disso, podemos notar um desnível em seu ombro direito, que está mais elevado que o esquerdo, o que indica um desequilíbrio emocional e insegurança em suas palavras.
Podemos concluir desse trecho que há desonestidade em relação a tranquilidade sentida pelo ex-Presidente

Em 1:35 - 1:36, a jornalista da Folha de São Paulo, pergunta: "O senhor já pensou que o senhor pode ficar aqui para sempre?"
Lula responde: "Não tem problema", e nesse momento ele se afasta com o corpo. Esse movimento indica distanciamento do que está falando. Nesse contexto há desonestidade. Existe uma preocupação do ex-presidente em continuar preso

A partir de 1:39, Lula diz: "Eu tenho certeza... que eu durmo todo dia...com a minha consciência tranquila; que eu tenho certeza que o Dallagnol não dorme; tenho certeza que o Moro não dorme."
De acordo com estudos de Análise do Discurso, existem palavras e frases que são verbalizadas apenas para convencer do que está sendo dito. Elas são consideradas desnecessárias em um discurso. Ou seja, a presença ou ausência delas não altera o sentido do discurso, mas a sua presença é usada para reforçar uma ideia afim de tornar seu discurso mais crível. De acordo com Mark McClish, a pessoa que tenta convencer tende a acrescentar o maior número de elementos verbais sob a conclusão de que isso vai tornar o seu argumento mais convincente.
Lula, começa dizendo "Eu tenho certeza que eu durmo todo dia com a consciência tranquila". A expressão "eu tenho certeza" é desnecessária. O fato dele verbalizar que dorme todo dia com a consciência tranquila, já pressupõe que ele tem certeza disso. O uso do elemento desnecessário "eu tenho certeza" em um discurso com uma certeza implícita mostra sua tentativa de convencimento.
Nesse trecho há também um elemento não-verbal importante. Ao dizer "tranquila" (referindo-se a sua consciência), Lula eleva assimetricamente o ombro direito além da gesticulação (foto acima). Esse gesto chamado de "Shoulder Shrug" indica insegurança em suas palavras (Joe Navarro).

A partir de 1:53, Lula diz: "Você pensa que eu não gostaria de estar em casa?"
Aqui o ex-presidente realiza um gesto de espalmar a mão em seu peito. Esse gesto tem um alto valor emocional se feito de forma correta e em perfeita sincronia.
Quando nos referimos a nós mesmos em um contexto de envolvimento emocional, tendemos a espalmar as mãos no peito para demonstrar esse envolvimento. Basta lembrar que ao tocar o hino, realizamos esse gesto para mostrarmos que estamos emocionalmente inserido naquele contexto.
Quando Lula fala que gostaria de estar em casa ele realiza esse gesto de mão espalmada, o que a princípio estaria congruente com o contexto, porém, aqui ele é realizado fora de sincronia.
Como o gesto tem uma intenção de se auto-referenciar, ele deve ser realizado no momento em que o indivíduo verbaliza a palavra "eu". Se o gesto ocorrer depois desse momento, podemos concluir que ele está sendo feito de forma mecânica, ou seja, pensado antes de ser realizado. E em relação a isso, a comunicação não-verbal tem uma regra: os gestos devem ser feitos durante ou antes da verbalização; se realizado depois, a intenção é de convencer.

A partir de 2:04, Lula diz: "... eu quero sair daqui com a cabeça erguida, como eu entrei"
Aqui vemos dois gestos ilustradores seguidos. 
Gesto de apontar para cima ao dizer "eu quero sair daqui". Esse gesto é considerado alfa e indica que o que está sendo dito é importante e merece atenção (foto 1)
O próximo gesto é chamado de "Pinçamento". Esse gesto indica desejo de transmitir uma ideia. A tensão do gesto indica uma dominância excessiva. Especialistas como Jack Brown, dizem que esse gesto, quando realizado com tensão funciona como um comportamento de compensação. O indivíduo está experienciando ansiedade, e o gesto o faz compensar essa ansiedade sendo mais agressivo e assertivo (foto 2)

A partir de 2:30, após um jornalista citar a morte do neto na pergunta, em 2:37, Lula reage à esse acontecimento.
Nesse momento, vemos alguns conjuntos de sinais interessantes.
Lula abaixa a cabeça, tampa os olhos com os dedos, logo depois notamos uma leve tremedeira em suas mãos e na área da mandíbula.
Os movimentos de abaixar a cabeça e tampar os olhos tem ligação com um distanciamento do fato. O desejo de não visualizar o que aconteceu. Jack Brown, afirma que esse conjunto gestual está ligado a processamento emocional relacionado ao fato
As tremedeiras acontecem pela alta carga emocional que o fato traz. É uma reação do Sistema Nervoso à liberação de hormônios ligados ao estresse e ansiedade. Essa reação também pode ser vista, dependendo do contexto, como um vazamento emocional. O agente está sob forte emoção mas deseja suprimi-la. O corpo quer externar, mas o agente controla para que isso não aconteça.
Pelo que podemos observar na foto acima, existe o abaixamento do canto dos lábios, contração essa ligada a emoção de tristeza

A partir de 2:43, Lula volta dizendo: "Eu as vezes penso que... seria tão mais fácil... que eu tivesse morrido..."
Notamos alterações em sua voz. A voz fica trêmula pela carga de emoção negativa.
Podemos notar também uma contração no músculo do corrugador (responsável pelo abaixamento das sobrancelhas), levantamento da parte interna das sobrancelhas, queda do canto dos lábios e uma leve elevação no queixo pela ação do músculo mentalis. Essas ações musculares estão presentes na emoção de tristeza
Ao dizer que "seria tão mais fácil", Lula eleva os dois ombros. Esse gesto simboliza descrença no que está falando
Lula realmente exibe tristeza ao falar da morte do neto, mas não acredita que seria mais fácil que ele tivesse morrido no lugar do neto.

A partir de 2:56, Lula diz: "Mas não é... não são apenas esses momentos que deixam a gente triste"
Primeiramente vemos um ato falho. Ele inicia usando o singular "não é", se referindo a um momento, e depois o consciente interrompe dizendo que "não são apenas esses momentos"
É interessante observar que esse trecho vem logo depois da tristeza sentida com a morte do neto.
Ao dizer "apenas" se referindo a tristeza da morte do neto, ele tira toda a importância do fato, no sentido emocional. Adicionado a isso, Lula coloca outros eventos no mesmo patamar de representação negativa que a morte do neto teve.

Logo a pós esse trecho, até o final do vídeo, podemos notar que Lula volta ao seu discurso racional, se desfazendo da carga emocional.
Sua intenção aqui é deixar de lado o emocional e manter o racional, a dominância. Não quer deixar que eventos emocionais atrapalhem seu objetivo
Um exemplo dessa sua intenção acontece em 3:16 - 3:17 quando ele dá um soco na mesa (foto acima) Esse gesto é completamente dominante e agressivo; e aconteceu logo depois dele falar da morte do neto.


SUMÁRIO: Lula apresenta desonestidade quando fala que estava tranquilo ao ser preso e que permaneceria preso por mais tempo. Há desonestidade também ao falar que tem sua consciência tranquila
Notamos dominância e agressividade ao falar de Sérgio Moro e do Procurador Daltan Dallagnol.
Existe tristeza ao falar da morte do neto, mas também uma intenção de suprimi-la. Aqui Lula não quer dar importância a esse fato negativo. Sua intenção é se manter como líder e dominante. Ele percebe sua função de líder e dominante acima de qualquer acontecimento negativo pessoal.

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