domingo, 6 de dezembro de 2020

[Análise não-verbal]: O comediante Marcius Melhem fala sobre denúncias de assédio sexual e moral. Culpabilidade?

O comediante, ator e ex-diretor do núcleo de comédia da Rede Globo, Marcius Melhem teve seu nome envolvido em várias denúncias de assédio, tanto moral quanto sexual.
Os atos de abusivos praticados pelo ator vieram à tona em 2019 após a, atriz - Dani Calabresa dar publicidade a eles.
Recentemente, a revista Piauí fez uma matéria completa e detalhada sobre o caso Marcius Melhem. Segundo a revista, em 2017, o comediante teria tido comportamentos abusivos com Dani Calabresa, que detalhou como tudo aconteceu. A matéria trouxe também outros casos de abusos, tanto morais quanto sexuais, que o, até então, diretor global teria praticado.
Após a divulgação da revista, Marcius concedeu uma entrevista em que se pronuncia, pela primeira vez, sobre as denúncias que sofreu, tanto por parte da atriz Dani Calabresa, quanto pelas outras pessoas que também se sentiram abusadas.
Nossa análise recairá apenas sobre um trecho da entrevista que o ator Marcius Melhem concedeu ao site UOL. Nesse recorte, avaliaremos os sinais verbais e não-verbais presentes, com a finalidade exclusivamente didática de responder o que sua linguagem corporal pode nos informar à respeito de tudo o que aconteceu e está acontecendo.

Vamos à análise:

O vídeo começa com Marcius Melhem falando: "Só para deixar claro, o quanto eu quero que isso seja esclarecido, e o quanto é importante que isso seja esclarecido..."
Percebemos uma dificuldade de verbalização durante o verbo "deixar". Segundo o autor Mark Knapp, essa dificuldade constitui o chamado "distúrbio da fala", e indica literalmente uma dificuldade cognitiva de afirmar o que está sendo verbalizado. De uma forma mais contextual, podemos afirmar que esse sinal paralinguístico se caracteriza por um desejo de fugir da situação.


Ao final desse trecho, podemos observais dois sinais não-verbais importantes. O ator tem sua frequência de piscadas aumentadas e imediatamente após, passa a língua nos lábios ("Tongue Jut") [Foto acima].
O aumento da frequência das piscadas, segundo Aldert Vrij indica um aumento da liberação de hormônios ligados ao estresse, ansiedade. Já o chamado "Tongue Jut", de acordo com especialistas em linguagem corporal, como por exemplo, Joe Navarro, é um forte indicativo de ansiedade e, dado o contexto, pode também constituir um indicativo de autoincriminação. Ainda segundo Joe Navarro, esse sinal é uma forma do corpo dizer: "Eu fiz besteira", "Eu quero sair ileso da situação".


A partir de 0:06, Melhem diz: "Eu tenho direito de ser julgado"
Novamente é possível notar um aumento na frequência de suas piscadas. Elas aceleram bastante. E, como já visto anteriormente, o aumento da frequência das piscadas está ligado a um estado de ansiedade e nervosismo.
Juntamente ele aponta para si mesmo apenas com as pontas dos dedos [foto acima]. Apesar deste ser um gesto bem subestimado por vários especialistas em linguagem corporal, ele pode nos trazer informações interessantes.
Segundo a doutrina da comunicação não-verbal, quando fazemos uma autorreferência, ou seja, falamos de nós mesmos, é comum vermos o agente apontando para si, quer seja apenas com as pontas dos dedos - como no caso, quer seja espalmando a mão na área do esterno. A forma como essa autorreferência acontece pode indicar a intenção do agente.
O gesto acontecendo apenas com as pontas dos dedos, pode indicar que o discurso de autorreferência tem uma intenção mais racional, sem sentimentos envolvidos. Já a autorreferência gestual acontecendo com a mão espalmada, indica um discurso mais emocional, mais envolvido, mais honesto, dependendo do contexto.
Levando em consideração que sua afirmação, durante o gesto, deveria ser mais emocional, pois está falando de direitos e julgamentos, ao realizar a autorreferência tocando apenas com a ponta dos dedos, existe uma incongruência entre o verbal e o não-verbal. Discurso emocional com gesticulação racional. Sabendo que a linguagem corporal constitui mais de 50% de toda a nossa comunicação, existe uma alta possibilidade de desonestidade de Melhem ao verbalizar esse trecho.

A partir de 0:09, o ator diz: "Eu não posso ser julgado pela opinião pública... exposto".
Notem que tanto neste trecho, quanto no anterior, ele usa a palavra "julgado", porém com sentidos diferentes.
Estamos avaliando o canal verbal de comunicação, que é responsável por 7% de nossa comunicação. Ou seja, em uma interação, 7% do que é comunicado fica à cargo do canal verbal (o restante é não-verbal). Estes 7% acontecem de forma consciente, pois as palavras proferidas são escolhidas pelo agente, salvo exceções, como é o caso dos atos falhos - que acontecem com uma determinada estrutura.
A escolha das palavras reflete um determinado estado emocional. Ou seja, se a pessoa está nervosa, as palavras escolhidas por ela vão refletir, de alguma forma, esse nervosismo; podendo ser na falta de detalhes, na estrutura, ou de outra forma.
No trecho analisado Marcius diz primeiro "julgado" e, em seguida conserta para "exposto". Apesar dele ter consertado, sua intenção foi associar a exposição ao julgamento. Em outras palavras, ele se refere ao julgamento público, que sofreu, devido a exposição que sofreu. Essa associação não foi feita de prontidão porque seu estado emocional de nervosismo - não permitiu. Houve, portanto a necessidade posterior de escolher uma outra palavra ("exposto") para dar o sentido querido ao julgamento.
Em resumo, no trecho anterior, a intenção era se referir ao julgamento legal; neste trecho, a intenção é se referir ao julgamento devido a exposição pública.

Ainda referente ao presente trecho, principalmente no começo, vemos novamente um aumento da frequência no número de piscadas, indicando nervosismo e ansiedade ao tratar do tema em questão

Em 0:28, Marcius diz: "... sobre as condutas violentas, que ela diz, que eu... que eu... tive"
Nesse trecho, ele está se referindo ao processo que moveu em face da advogada de Dani Calabresa, pelas coisas que foram faladas contra ele, e que, segundo ele, não foram provadas.
Podemos notar que no final desse trecho, ele gagueja juntamente com pausas desnecessárias. Ambos os sinais paralinguísticos constituem os chamados "distúrbios da fala"
A gagueira conjugada com a pausa desnecessária constituem um forte indicativo de ansiedade, devido à dificuldade de verbalizar determinado assunto
A dificuldade de falar sobre as condutas violentas é incongruente com um contexto de inocência. Devemos nos perguntar: "Se o indivíduo não cometeu tais condutas violentas, por que ele fica ansioso ao falar sobre tais condutas?" 
Geralmente, o indivíduo inocente consegue falar sobre uma conduta injustamente associada a ele.


No final do trecho acima, ao dizer "tive", vemos dois sinais interessantes.
O primeiro é a sutil contração bilateral dos ombros. Esse movimento é chamado de "Turtle Effect". Ele faz alusão às tartarugas, que entram em seus cascos quando se sentem ameaçadas e com medo, para se protegerem. Quando os agentes se sentem na mesma situação de medo e de ameaça, pode acontecer tal tensionamento dos ombros. 
Além disso, podemos perceber um movimento não-natural. O ator eleva as sobrancelhas ao mesmo tempo em que fecha os olhos. A falta de naturalidade se dá pelo fato do direcionamento dos movimentos serem opostos (enquanto as sobrancelhas se movimentam para CIMA, os olhos se fecham - havendo portando o movimento para BAIXO).
De acordo com Jack Brown, esse movimento, por não ser natural e terem direcionamentos opostos, tem um forte potencial de desonestidade.
[No recorte acima, em câmera lenta, podemos perceber os sinais citados].

Imediatamente em seguida, vemos uma sutil expressão de medo, devido ao estiramento horizontal dos cantos dos lábios

A partir de 0:50, Marcius Melhem diz: "Eu e ela [Dani Calabresa] sabemos que aquilo ali não aconteceu"
Aqui vemos vários sinais incongruentes.
Em primeira análise, é importante dizer que durante todo esse trecho é possível notar um aumento repentino no número de piscadas. Como já dito anteriormente, isso constitui um forte indicativo de ansiedade e nervosismo.
Marcius Melhem, quando diz: "Eu e ela" realiza um movimento corporal para trás, indicando afastamento e desejo de fuga
O fato de Melhem usar o pronome "ela" ao invés de dizer o nome Dani Calabresa, constitui uma linguagem de afastamento. Segundo Mark McClish, quando o agente substitui o nome da pessoa a quem ele se refere por um pronome, existe a intenção de se distanciar da pessoa, logo há o desejo de fuga. Dizer "Eu e ela", é diferente de falar "Eu e a Dani Calabresa". Quando existe uma referência, o padrão verbal é citar a pessoa pelo nome.
Nesse trecho, o ator ainda usa outro tipo de linguagem de distanciamento. Ele não fala diretamente o que estão alegando que aconteceu e nem sobre o que está sendo denunciado. Segundo ensinamentos de Statement Analysis, ausência de uma linguagem direta indica intenção de fuga e omissão.
Nesse caso, o congruente seria dizer: "Eu e a Dani Calabresa sabemos que o assédio não aconteceu"


Imediatamente em seguida, ao verbalizar "sabemos", notamos uma elevação sutil e unilateral em seu ombro direito ("Shoulder Shrug"), que, segundo Joe Navarro, indica insegurança em suas palavras.
[No recorte acima, em câmera lenta, é possível observar um movimento sutil com o ombro esquerdo]


Ao final do trecho, é possível reparar um gesto de afirmação com a cabeça. Nesse contexto, este gesto indica um incongruência entre o verbal e o não-verbal. Enquanto o verbal nega o acontecimento, o corpo reage contrariamente, afirmando com a cabeça.
Logo após, vemos que o ator engole em seco. Essa ação indica forte ansiedade e nervosismo. Devido a esses estados emocionais negativos, pode haver um ressecamento da garganta, resultando em uma dificuldade de engolir. [No recorte em câmera lenta acima é possível observar esses sinais]
Todos esses elementos, em conjunto, contribuem para determinar que esse trecho contém um alto coeficiente de desonestidade.

A partir de 0:57, Marcius Melhem diz: "Eu sou a pessoa mais interessada de que tudo isso seja esclarecido".
Nesse trecho podemos observar uma negação de cabeça enquanto verbaliza ser a pessoa mais interessada. Quando um gesto de negação é realizado enquanto há uma afirmação verbal, dizemos que existe incongruência, e tendo em vista que, mais da metade da nossa comunicação é não-verbal, o sinal corporal é o mais confiável.


Logo em seguida, ao dizer "tudo isso", vemos um afastamento corporal para trás juntamente com uma sutil elevação unilateral do ombro direito. Estes dois sinais em conjunto indicam insegurança e falta de confiança em suas palavras.
Os indícios apontam que Marcius Melhem não deseja que tudo seja esclarecido.
[No recorte acima, em câmera lenta, podemos ver a elevação sutil no ombro direito]

A partir de 1:00, ele diz: "Eu tenho... por exemplo, vamos falar da Dani Calabresa"
De acordo com estudos de Statement Analysis, nesse trecho houve quebra da coerência discursiva. Ele não explica o que tem. Segundo Mark McClish, constitui um forte indicativo de omissão.


Durante a pausa, vemos novamente o gesto de passar a língua nos lábios ("Tongue Jut"), indicando ansiedade. Mais especificamente, segundo Joe Navarro, esse gesto pode denotar também desejo de sair ileso de uma situação ou de algo que tenha pensado ou falado.
O fato dele ter realizado o "Tongue Jut" enquanto olhava para cima e esquerda, indica que ele pensou em algo que poderia ser negativo para ele, e isso o fez mudar o discurso.
O movimento ocular para cima e esquerda, segundo a PNL, indica que o agente está criando uma imagem mental, pois este movimento acessa a área do cérebro responsável pela criação de imagens.

A partir de 1:30, Marcius diz: "... assediado a Dani Calabresa ao longo dos anos, a partir de 2017"
Se referindo ao que a revista Piauí publicou.
Ao falar "2017" podemos observar uma queda repentina em seu volume vocal. Segundo Mark Knapp, essa alteração pode indicar um desejo de que a mensagem não seja escutada; fuga. Quanto mais baixo o volume, maior é o interesse de que não escutem o que estamos falando.


No final do trecho acima, vemos uma expressão de medo, devido ao estiramento horizontal dos cantos dos lábios e uma elevação sutil nas pálpebras superiores.


A partir de 1:47, Marcius diz: "... nós sabemos em que ponto a nossa relação se deteriorou profissionalmente"
No final do trecho, podemos ver novamente o ator realizando o gesto de passar a língua nos lábios ("Tongue Jut"), demonstrando ansiedade e uma possível autoincriminação.
Podemos interpretar este trecho, baseado no que já foi analisado, que Marcius pode acreditar que a deterioração da relação profissional deles foi por sua própria culpa.


A partir de 1:56, o comediante diz: "Eu quero acreditar que a Dani Calabresa sabe, que aquilo ali não aconteceu".
Enquanto verbaliza "aquilo ali", notamos uma microexpressão de felicidade, devido a sutil elevação dos cantos dos lábios. [Foto acima].
A emoção de felicidade é incongruente com um contexto de denúncia de abusos.
Além disso, a expressão "aquilo ali" demonstra uma linguagem de afastamento, segundo ensinamentos de Statement Analysis. Dizer isto evita que o agente especifique, de forma direta, no que ele realmente está envolvido. Há uma omissão. "Aquilo ali, o quê?, "O que não aconteceu?". 

Em 2:16, Marcius Melhem diz: "É impossível aquilo ter acontecido"
Novamente vemos uma linguagem de distanciamento ao dizer "aquilo" ao se referir dos abusos.


SUMÁRIO: É importante dizer que durante todo o vídeo seu padrão discursivo baseou-se em evasividade. Há ausência de linguagem direta. Quando um indivíduo é inocente - e tem a oportunidade de se defender, como padrão comportamental, é comum que ele diga "eu não fiz...", "Eu não abusei sexualmente", etc. Esse padrão não é seguido por Marcius Melhem, o que constitui um forte indício de culpabilidade.
Em vários momentos, o ator demonstra medo ao falar da situação em que se encontra. Incongruentemente, ele demonstra também a emoção de felicidade em um momento em que fala do assédio.
Podemos observar vários sinais de ansiedade e nervosismo ao tratar do tema em questão.
Há também, sinais de insegurança e de autoincriminação.
Tanto no campo verbal - como no não-verbal há indícios de desejo de fuga e omissão.

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